quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

da síndrome das "doces palavras"

Houve um tempo em que as palavras eram minhas melhores amigas. Seja as que bailavam nos livros que lia, seja as que desenhava nas folhas de papéis em que escrevia toscos versos. Nessa época, as palavras eram meu refúgio, meu alento, as únicas que entendiam as chagas do meu coração.

Os anos foram passando, e essas tão queridas amigas passaram também. No frenesi do dia-a-dia, troquei as palavras doces dos livros e dos versos, pela dura e árdua burocracia da Universidade. Era conhecida por “ter uma mentalidade mais madura do que as pessoas da minha idade”, e o tempo de separação das doces palavras fez com que isso mais e mais se tornasse realidade.

Se o dom de gracejar nunca foi uma grande virtude em mim, quando abandonei minhas grandes amigas – as doces palavras – tornei-me séria a ponto de envelhecer, apesar da pouca idade. Os dias tornaram-se tão curtos para honrar todos os afazeres, que chegar perto de palavras “não-burocráticas” tornou-se impossível. Páginas e páginas de textos “científicos”, num palavreado monótono e boçal, passaram a preencher meus dias; e o brilho que outrora as doces palavras dos textos literários pintaram em meus olhos simplesmente desapareceu.

A facilidade para descrever cenas, sentimentos, desejos, anseios, opiniões, tudo isso sumiu e minha escrita enquadrou-se no velho modelo jurídico. Vai longe o tempo em que escrevia redações dignas de serem encaminhadas para concursos de literatura – aliás, vai longe o tempo em que escrevia redações. Vai longe o tempo em que minha maior preocupação era ir à biblioteca, porque acabara de ler os três livros que emprestara. Vai longe o tempo em que tinha disponibilidade para alimentar assim minh’alma.

Se de um lado ingressar numa Universidade é símbolo de esforço, dedicação, sucesso; de outro, é deixar de ser senhor do seu próprio tempo, senhor dos seus próprios passos, senhor das suas próprias vontades. Se de um lado é na Universidade que desenvolvemos nosso senso crítico, que amadurecemos e nos tornamos adultos; de outro, é nesse espaço que nossa alma enegrece e a criança que dava encanto ao nosso ser morre. Se de um lado é através da Universidade que temos possibilidade de conquistar nosso sustento; de outro, é através da Universidade que nos tornamos escravos de algo que nem mesmo nós conseguimos explicar.

Nascimento - Escola - Universidade - Cursos - Congressos - Viagens - Carreira - Casamento - Morte. Onde estão as doces palavras nesse ciclo?! Às vezes me pergunto quanto tempo mais suportarei essa escravidão. De que vale um diploma sem as doces palavras?
Que as doces palavras não morram em você, como um dia morreram em mim.


Calliope Moça-Flor




























Um comentário:

Lady Sarajevo disse...

isso não é uma regra, creio.
as doces palavras estão aí, à nossa cara.

beijos!!
saudades!!